terça-feira, 27 de setembro de 2011


Mortalidade Infantil

Pedro Manuel Leal Germano
Professor Titular da Faculdade de Saúde Pública
Universidade de São Paulo
            
             Porque morrem as crianças é a pergunta que habitualmente se faz ao ler ou ouvir notícias dedicadas às tragédias globais.

             As estatísticas sobre mortalidade infantil, porém, apontam para o próprio ambiente doméstico, onde se esperava que houvesse tutela responsável, no mínimo, por parte das mães, quando estas estão presentes e acompanham o desenvolvimento dos filhos. Não pense o leitor que desconsiderei o papel do pai, pelo contrário, ele é tão responsável quanto a mãe pode ser, desde que agindo como participe no processo de criação da criança.

            A pobreza é um fator que dificulta o cumprimento dos tópicos que serão apontados a diante, mas não os inviabiliza desde que haja bom senso e vontade de reconhecer suas próprias limitações.

A ignorância, porém, é o fator mais contundente e, também, o mais difícil de superar. Mãe ou pai sem instrução não são capazes de entender, nem o mundo em que vivem, muito menos o da criança com quem compartilham o mesmo espaço. É certo e sabido que quanto menor o nível de instrução, notadamente, por ignorância associada a teimosia irracional, maiores os riscos provenientes de acidentes ou mesmo maus tratos às crianças, tais como, manobras bruscas, totalmente inconvenientes, que podem provocar lesões físicas e até matar. A colocação de gargantilhas ou enfeites no pescoço da criança pode provocar sua asfixia por acidente durante o sono.

Mencionam-se, a seguir, uns poucos exemplos, dentre tantos outros disponíveis na literatura médica, todos possivelmente, fatais na dependência do tipo e intensidade da exposição: (1) desnutrição por carência de alimentos ricos em proteínas, sobretudo leite ou por insuficiente qualidade daquele oferecido pela mãe no período de lactação, entre outros; (2) gastroenterites provocadas por alimentos contaminados ou deteriorados, causando diarreia, cólicas, vômitos e por fim podendo levar à morte por desidratação; (3) desrespeito total às datas de vacinação, tais como, tuberculose (BCG), poliomielite (VOP), tetravalente. (tétano, difteria, coqueluche, meningite), SRC (sarampo, rubéola, caxumba), Hepatite B e febre amarela, esta nas regiões endêmicas, todas elas preocupantes, com gravidade dependente da idade e do grau de higidez da criança; (4) não obediência às doses, horários e duração de tratamento prescritos pelos serviços médicos, qualquer que seja sua indicação, pois, quando fornecidos em doses maiores que o recomendado, podem resultar em intoxicação ou mesmo envenenamento da criança, por outro lado, se administrados em doses inferiores às receitadas o mal poderá evoluir levando ao óbito por  maus tratos; (5) temperaturas extremas, tanto quentes, quanto frias, podem ser prejudiciais à saúde das crianças, em especial às de poucos meses de vida, como acontece com a água do banho muito quente, muitas vezes superior a 37oC, qualquer que seja a temperatura ambiente, uma vez que pode provocar queimaduras, cuja gravidade dependerá da área comprometida e sua extensão, e ao contrário, quando muito fria, sobretudo em dias de muito calor, pode favorecer a instalação de quadros pneumônicos, sendo que em ambas oportunidades o desenlace pode ser fatal; (6) exposição exagerada a correntes de ar, sobretudo por janelas mal fechadas em madrugadas frias, agravando quadros respiratórios, ou ao sol, provocando queimaduras ou até insolação, principalmente quando não há qualquer tipo de proteção física como uma sombra ou um chapéu, ou proteção química fornecida por loções protetoras; (7) manutenção  da criança em ambiente úmido e mofado, mesmo dispondo de outros lugares mais salubres na moradia, alegando preservação da intimidade do casal, o que pode agravar certas doença respiratórias, entre elas asma e gripe, responsável por muitos casos de pneumonia, e até de óbitos infantis; (8) punições repetidas, algumas delas até perversas, notadamente, com restrição física, podendo causar, por exemplo, ao longo do tempo, problemas ósseos por privação de sol, fator determinante de raquitismo, ou distrofias mio articulares, não só por limitação exagerada de movimentos, motivada pela frequente permanência em lugares de pequenas dimensões, mas, também, decorrente de agressões com os mais diferentes tipos de materiais, seja reservados para tal ou encontrados ao acaso, tais como, tiras de corda, borracha, couro ou pedaços de madeira, entre tantos outros; e, (9) castigos de restrição mental, os mais prejudiciais para as crianças, uma vez que alteram o sentido do todo, modificando comportamentos, tornando-as agressivas ou excessivamente submissas.

Após a ocorrência do episódio maior, a doença se instala e, então, panaceias caseiras, rezas e benzeduras são tentadas, claro que sem nenhum sucesso, e aí sim, instala-se o desespero e a única alternativa é procurar o posto de saúde mais próximo, porém, de modo geral, já é muito tarde e nada mais há a fazer.

Deve-se considerar, contudo, que cada família, por mais inculta que seja, tem seus próprios valores ou crenças, mas, ninguém da família consegue ou quer compreender porque as práticas domésticas, há tantos anos empregadas, pelas avós, bisavós, tias e curandeiras não deram certo.

            Uma vez o fato confirmado chegou o momento de dar uma explicação sobre o acontecido. Mas, esta nunca será dada! Nada melhor que o silêncio demonstrando pesar. Afinal, ninguém quer expor seus erros à opinião pública!

A bem da verdade, estes fatos não ocorrem apenas nas pequenas cidades das zonas rurais; não, isto ocorre em qualquer lugar do mundo, de certo, com maior frequência nas comunidades desfavorecidas.

             Os exemplos apresentados apoiam-se, sobretudo, na ignorância, consequência de um ato irrefletido, gerado, simplesmente, por falta de atenção ou puro esquecimento, ou na dita ignorância crônica ou estupidez, falta de saber.

            Sem sombra de dúvida, a ignorância é a mãe de todos os males que afetam o mundo, sejam de ordem sanitária, econômica, racial, religiosa e até mesmo bélica e ela afeta dramaticamente a população infantil.



terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Os perigos potenciais da sujeira no ambiente domiciliar

Professores Pedro Manuel Leal Germano & Maria Izabel Simões Germano
Coordenação do Curso de Especialização em Vigilância Sanitária de Alimentos

Vamos considerar uma casa média com 2 ou 3 dormitórios, sala de jantar, sala de estar, copa e cozinha, 1 ou 2 banheiros e área de serviço. Isto corresponde a um apartamento. Se for uma casa, térrea ou sobrado, há que se incluir quintal, gramado, plantas, gaiolas para pássaros, locais para criação de cães e gatos, etc., etc..
Portanto, vamos nos ater ao apartamento.

Bolores e mofos e até ácaros são acumulados, facilmente, em livros, nas estantes, por motivo de umidade e pouca luminosidade. Do mesmo modo podemos encontrar excesso de poeira acumulado, por falta de limpeza periódica. Nos dois casos, o problema diz respeito a alergias, não só de pele como respiratórias, sobretudo, rinite e asma.
Nos lugares do apartamento com estofados, carpetes e cortinados valem as considerações anteriores. Contudo, há alguns agravantes, como o mau uso por parte de crianças, animais de estimação, os próprios donos e as visitas – sapatos, roupas usadas no trabalho e nos transportes coletivos, o hábito descuidado de comer e beber sobre sofás e poltronas, além de jornais jogados sobre esses assentos: onde há sujeira sempre há a possibilidade de microrganismos, germes se preferirem, se acumularem e serem disseminados para outras dependências, seja pelas pessoas, seja pela transferência de objetos de uma sala para a outra ou, ainda, pelo próprio ar ambiental. Isto piora se houver ventilador e condicionador de ar – ácaros. Novamente, os problemas são de ordem cutânea e respiratória.
O mesmo raciocínio se aplica para a denominada sala de jantar, onde os acidentes são mais comuns, embora a maior parte atinja a toalha. Porém, o solo, seja de madeira ou de cerâmica é vítima importante, onde a matéria orgânica vai se espraiar. Novamente, o problema diz respeito às bactérias, especialmente as patogênicas para o homem.
Importante: enquanto não houver acúmulo de matéria orgânica, as bactérias não terão condições de proliferação.

A cozinha é outro problema, pois quando se retorna das compras de perecíveis, as próprias matérias-primas têm sua flora de parasitas, muitos deles patogênicos para o homem e para os animais. Isso pode ser evitado através de medidas de higiene rigorosas, desde a colocação das embalagens sobre a mesa ou balcão da pia, até sua colocação nos armários, freezer e geladeira – que devem estar rigorosamente higienizados. O rompimento da embalagem plástica do frango, por exemplo, após descongelamento, é perigoso porque o líquido avermelhado que vasa do pacote, geralmente está contaminado, com freqüência por enterobactérias patogênicas, entre as quais se inclui a Salmonella enteritidis.
A geladeira, quando a 4o C, preserva os alimentos e impede a multiplicação dos microrganismos, garantindo sua inocuidade. Porém, como todos os equipamentos da cozinha, deve ser mantida bem regulada e limpa, principalmente em sua parte interna, gavetas e prateleiras – de preferência higienizada com água e bicarbonato ou outro produto adequado (sanitizante). A grande maioria das bactérias é afetada por temperaturas baixas, exceto a Listeria, que é encontrada com freqüência nos ralos da cozinha e que consegue multiplicar-se nos produtos estocadas na geladeira. Os alimentos que necessitam ser conservados em geladeira, devem obedecer os prazos estipulados para cada produto. Geladeira não mata microrganismos. Geladeira não se estraga quando se colocam alimentos, ainda, quentes – apesar de tudo o que está no seu interior vai sofrer um aumento da temperatura, que deverá perdurar por um curto lapso de tempo.
O mesmo princípio se aplica para o congelador (freezer) – higiene e desinfecção são sempre soluções práticas que diminuem, substancialmente, os perigos dentro de uma cozinha.

A água destinada aos alimentos deve ser, de preferência, filtrada, evitando-se aquela proveniente de caixas de água, sobre a qual não há qualquer registro sobre a qualidade higiênico-sanitária da água. Água de má qualidade pode ser responsável pela veiculação de vírus, entre os quais destacam-se a Hepatite A e o norovírus. Além destes patógenos, vale mencionar a criptosporidiose, provocada por um protozoário.
A maneira de reduzir os perigos de uma cozinha consiste na limpeza com água e detergente, para remover gorduras; na desinfecção com cloro; e, no ato de destinar todos os resíduos indesejáveis para a lixeira, a qual deverá ser mantida com tampa.
Moscas e baratas são prejudiciais à saúde por transportarem nas patas, antenas, corpos e asas microrganismos patogênicos.
Outra observação importante: folhosos para saladas e outros fins, assim como, frutas devem ser higienizadas, lavadas e desinfetados com cloro; matérias-primas como carnes e peixes devem ser consumidas cozinhadas. O consumo de pratos crus é perigoso e a responsabilidade é do próprio consumidor.

Problema com banheiros. É claro que constituem um ambiente passível de perigo, principalmente, se as condições de higiene, manutenção e conservação não forem adequadas. O vaso sanitário deve ser mantido com a tampa, permanentemente, fechada; bidê, banheira, lavatório, box de chuveiro ou ducha são peças que exigem limpeza periódica e regulagem adequada, no que tange ao fluxo de água e escoamento para o esgoto. Equipamento bem regulado, notadamente a descarga, não deve permitir o refluxo da água para o piso, muito menos jatos à distância. Complementarmente, restos de sabonetes não devem ser mantidos, indefinidamente, nas saboneteiras, sobretudo se estiverem ressecados e sujos. Pentes e escovas, também, devem ser higienizados, de modo a que não haja acúmulo de cabelos – problema de ordem estética; e, prevenção de doenças parasitárias.
Mas, o grande problema com a higiene dos banheiros diz respeito às enterobactérias, entre as quais podem ser citadas: a Salmonela spp, a Shigella spp, e os coliformes fecais, grupo no qual se encontra a Escherichia coli. Novamente, referem-se vírus, como o da Hepatite A e os norovírus. Além destes, podem ser mencionados, todos aqueles patógenos do homem, causadores de transtornos gastro-intestinais, traduzidos, em geral, por diarréia e vômitos. Neste contexto, pode-se até referir os helmintos, como ovos de áscaris (lombrigas) e anéis de tênia (solitária).
Nos banheiros, a lixeira, revestida de saco plástico, deve ser mantida tapada e limpa, diariamente, com a remoção de seu conteúdo para a lixeira principal do apartamento. A lixeira do banheiro é altamente contaminada por microrganismos – coliformes fecais e outras bactérias.
Escovas de dentes devem ser mantidas em posição vertical, após remoção de pasta dentifrícia e resíduos.
Torneiras, registros, botão de descarga e outros acessórios do banheiro podem ser fonte de contaminação, na dependência da higiene do usuário – falta de educação e mesmo de cidadania.

Todos os armários, recipientes, estojos, caixas, utensílios do banheiro devem ser mantidos limpos, pois estão sempre sob manipulação de mãos. Lavar as mãos é um hábito sadio para todos, inclusive o próprio usuário. As mãos conduzem, fatalmente, à contaminação dos alimentos, seja uma simples maçã, seja um prato pleno de quitutes preparados com todo o esmero higiênico-sanitário.

Maus hábitos de higiene, como assoar o nariz sobre qualquer peça do banheiro, sobretudo lavatório, provocam disseminação de microrganismos alojados nas fossas nasais, como o Staphylococcus aureus, responsável por inúmeras patologias do homem. Estes maus hábitos, também, podem favorecer a disseminação de Streptococcus pyogenes, causadores de graves infecções, particularmente, em crianças.

Os quartos são peças íntimas, que devem ser preservadas de excessos, tais como: visitas, animais de estimação e mesmo lanches com sanduíches e bebidas. Migalhas, restos de comida, líquidos acidentalmente borrifados sobre cobertas, lençóis e almofadas acabam por atrair insetos indesejáveis, além de gerarem odores repulsivos. Os mesmos problemas relatados no primeiro tópico são aplicáveis, a este contexto.
Fazer a cama é uma condição meramente de higiene. Tapetes no quarto favorecem acúmulo de poeira e, conseqüentemente, ácaros, assim como, o ar condicionado do dormitório. A troca periódica de filtros deste aparelho se impõe como modo de reduzir a carga bacteriana acumulada ao longo dos meses de uso.
O quadro é mais complicado quando há enfermos acamados. Neste caso, os microrganismos do doente disseminam-se através do ar ambiente para todas as dependências, tal como ocorre nas infecções respiratórias, provocadas por gripes, complicações pneumônicas e bronquites. Mais grave, ainda, se o enfermo padecer de tuberculose.
Roupas sujas devem ser lavadas conforme a necessidade. A máquina de lavar roupa, bem como, a secadora, devem estar reguladas e limpas. Roupas de enfermos, com doenças contagiosas, devem ser lavadas em separado, para evitar disseminação dos agentes patogênicos.
A higiene é fundamental. Lavar as mãos, ao chegar da rua, antes de comer, após utilizar o banheiro, antes de utilizar o teclado do microcomputador ou notebook, para digitar dados, cartas ou textos, ou mesmo abrir correspondência eletrônica é um hábito salutar. Evita a disseminação de patógenos do ambiente externo para o interior do apartamento, bem como, sua disseminação por todas as dependências. Diminui, inclusive, a contaminação de telefones fixos, interfones e dos próprios telefones móveis (celulares). O mesmo se aplica para interruptores, maçanetas e superfícies em geral.
Correção de maus hábitos é imprescindível. Animais de estimação são bem vindos, desde que vacinados, bem alimentados, e mantidos em áreas próprias, limpas e abrigados de intempéries naturais – chuva, granizo, excesso de frio ou de calor. Contato com animais estranhos, mesmo que de vizinhos é perigoso. Contato com animais de rua é indesejável.
Gatos arranham. Cães mordem. Todos urinam e defecam. Têm diarréia e vômitos. Padecem com problemas respiratórios, tossem e espirram. Espirram e têm catarro. Por isso devem ser tratados com responsabilidade. Animais de estimação, bem cuidados, alegram o ambiente, ajudam as crianças a criar afeto e responsabilidade, a respeitar e compreender os animais.
Pêlos de gatos, em pessoas alérgicas, podem exacerbar a sintomatologia, seja de natureza cutânea, seja de origem respiratória. Os cães, também, podem provocar os mesmos problemas, porém com menor freqüência.

Dedetização do apartamento, só com empresas idôneas, para evitar má utilização de produtos tóxicos. Crianças, pessoas sensíveis, idosos, grávidas, convalescentes, pássaros e animais de estimação devem ser afastados desse ambiente, de acordo como estipulado pela empresa. Transgredir estas instruções é assumir um perigo por irresponsabilidade.

Importante lembrar: sujeira não aumenta imunidade, contudo ninguém é saudável se for mantido em ambiente estéril. Limpeza e higiene diminuem a carga contaminante aos limites toleráveis pelo organismo humano e animal.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

A IMPORTÂNCIA DA QUALIDADE DA ÁGUA EM SAÚDE PÚBLICA

Pedro Manuel Leal Germano
Maria Izabel Simões Germano

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), mesmo nos países da OECD (Organization for Economic Cooperation and Development), surtos provocados por doenças veiculadas pela água são mais freqüentes do que se divulga, devido ao desconhecimento de suas causas e à elevada subnotificação. O problema assume dimensões muito maiores nos países considerados economicamente menos favorecidos, onde milhares de pessoas, independente da faixa etária e sexo, são acometidas.
A demanda de água no planeta vem crescendo, constantemente, e tem como causa o aumento da população e a concentração de pessoas nas cidades. Por estas razões, a água não é mais considerada um recurso infinito, e, é sério o risco das reservas se esgotarem, devido, sobretudo, ao mau uso das fontes naturais.
Para agravar, ainda mais, este quadro, estatísticas da OMS estimam a população mundial, para o próximo decênio, como superior a 7 bilhões de habitantes, apesar de todas as intempéries naturais e conflitos armados, responsáveis por milhares de mortes.
A satisfação da demanda de água representa um problema, pois além do enorme volume consumido e desperdiçado, nem sempre a restituição do produto ao meio natural, sem tratamento prévio, está isenta de riscos à saúde e ao próprio ambiente. É o que acontece com a contaminação e a poluição provocadas pelos efluentes domésticos, públicos e industriais, lançados diretamente nos cursos de água. O mesmo se aplica para os resíduos químicos, provenientes de adubos, defensivos agrícolas e inseticidas, comumente utilizados nas práticas agropecuárias, e que mediante as precipitações pluviométricas alcançam, por escoamento, os lençóis freáticos, os rios e os lagos naturais ou artificiais, colocando em risco a sobrevivência de qualquer forma de vida nesses ecótopos.
Na verdade, a água pode constituir um risco considerável para a sociedade, não apenas no que tange ao aspecto higiênico-sanitário, mas como recurso natural estratégico para assegurar a geração de bens econômicos - como geradora de energia é um bem essencial para a indústria e, extremamente, importante para a conservação de alimentos (refrigeradores, câmaras frias e outros), todavia as barragens e hidrelétricas podem afetar diretamente o meio ambiente.
Desta forma, a água, constitui uma questão de segurança nacional, tanto no que se refere aos recursos hídricos como aos ecossistemas que os mantêm, e como tal merece a adoção de estratégias direcionadas para cada um de seus aspectos particulares, todos eles de relevância para o desenvolvimento social e econômico dos povos, especialmente, no que concerne à saúde pública.

>>>Doenças de veiculação hídrica

Os agentes biológicos continuam sendo os fatores mais importantes de contaminação da água, assim como, dos alimentos. Bactérias, protozoários, vírus e helmintos originam-se, sobretudo, na contaminação fecal humana ou animal, das águas destinadas ao consumo ou às atividades recreacionais.
A contaminação da água, no aspecto macroambiental, pode ocorrer na fonte, durante a distribuição ou nos reservatórios. No âmbito dos conjuntos populacionais, estabelecimentos comerciais e industriais, particularmente, da área de alimentos, as causas mais freqüentes de contaminação dizem respeito às caixas de água abertas ou mal fechadas e à carência de hábitos de higiene pessoal e ambiental.
As doenças de veiculação hídrica transmitem-se através da ingestão de água contaminada por microrganismos patogênicos, eliminados nas fezes do homem e/ou dos animais, notadamente onde as condições de saneamento básico são precárias. O mesmo se aplica à qualidade da água destinada à higienização de produtos vegetais in natura, instalações, recipientes, utensílios e manipuladores, suas roupas e mãos.
Estas doenças compreendem uma variada gama de patologias gastrointestinais como: disenteria, giardíase, hepatite A, rotavirose, norovirose, além das infecções epidêmicas clássicas como cólera e febre tifóide. O resultado de sua elevada endemicidade constitui ônus elevado para os países em desenvolvimento, onde seus efeitos são contundentes para a saúde pública, atingindo até 50% da população.

>>>O impacto sobre a população infantil

A qualidade da água e sua precária condição higiênico-sanitária estão entre as principais causas de mortalidade infantil - entre as cinco mais freqüentes causas de óbito na faixa de um a quatro anos de idade. Estas crianças registram, em média, 3 episódios diarréicos por ano, mas em certas zonas o quadro patológico pode se repetir 9 vezes ao ano. A morbidade e a mortalidade são mais altas entre as menores de dois anos, até 90% dos que morrem por diarréia pertencem a este grupo. A causa mortis principal, sobretudo nas crianças, é a desidratação, devido à perda brutal de líquidos e de eletrólitos, provocada pelo quadro diarréico, primariamente, e pelas complicações intercorrentes como má nutrição e pneumonias.
Vale enfatizar que, em saúde pública, a endemicidade das doenças de veiculação hídrica é extremamente prejudicial para o desenvolvimento da população infantil. Sucessivas crises de diarréia, nas primeiras idades, são altamente nocivas, pois conduzem à desnutrição, por diminuição do apetite e pela diminuição da capacidade de absorção intestinal. A manutenção do “permanente” estado de doente, ao longo do tempo, determina o atraso do crescimento e dificulta o desenvolvimento mental.

>>>As conseqüências em saúde pública

A maioria das infecções intestinais é assintomática, o que se torna patente quando se considera a idade dos acometidos. A partir dos dois anos de vida, e à medida que aumenta a idade, a resposta imune aos agentes agressores vai-se tornando mais evidente e como conseqüência diminui, substancialmente, a manifestação clínica da infecção. Todavia, o estado de portador assintomático, que pode persistir por até semanas, é muito importante na epidemiologia das gastroenterites infecciosas, uma vez que a eliminação dos agentes patogênicos no ambiente propicia a contaminação da água e dos alimentos. Por outro lado, os indivíduos nestas condições, desconhecendo o perigo que representam para a sociedade, não adotam qualquer precaução higiênica para evitar a contaminação ambiental.
As doenças passíveis de serem provocadas pela ingestão de água contaminada são muitas e variadas, bem como, suas manifestações e repercussões em saúde pública. Cabe lembrar que, além das crianças com idade inferior a dois anos, são suscetíveis e correm risco de vida: idosos, convalescentes e, particularmente, imunocomprometidos.

>>>Conclusão

A crise da falta de água constitui uma urgência no mundo atual. Os homens necessitam se conscientizar da premência de utilizar, adequadamente, este recurso com vistas à preservação das gerações futuras. Cada um deve cumprir a sua parte na conservação dos recursos hídricos, como dizia Mahatma Gandhi “... nós temos que ser o mundo que nós queremos ter...”. É vital que os setores públicos e privados, assim como, todos os cidadãos estejam conscientes de suas responsabilidades e colaborem para a manutenção deste bem, sem o qual a vida em nosso planeta não é possível.

>>>Referências
Geldreich EE. La amenaza mundial de los agentes patógenos transmitidos por el agua. In: Gunther FC, Castro R. La calidad del agua potable en América Latina: ponderacion de los riesgos microbiológicos contra los riesgos de los subproductos de la desinfección química. Washington, D.C.: OPS/ILSI Press; 1996. p. 21-49.

Germano PML, Germano MIS. Higiene e vigilância sanitária de alimentos. Barueri: Manole, 2008.

Germano PML, Germano MIS. Alimentos e suas relações com a educação ambiental. In: Philippi Jr A, Pelicioni, MCF. Educação ambiental e sustentabilidade. Barueri: Manole, 2005. p. 771-812.

Macêdo JAB. Águas e águas. São Paulo: Varela, 2001.

Traverso HP. Agua y salud en América Latina y el Caribe: enfermedades infecciosas transmitidas por el agua. In: Crawn GF, Castro R. La calidad del agua potable en América Latina: ponderacion de los riesgos microbiológicos contra los riesgos de los subproductos de la desinfección química. Washington, D.C.: OPS/ILSI Press; 1996. p.51-62.


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Maria Izabel Simões Germano – Pedagoga pela PUC/SP, Mestre e Doutora em Saúde Pública pela FSP/USP. Professora Convidada dos Cursos de Pós-Graduação e de Especialização da FSP/USP. Atuação profissional nas áreas de Educação, Formação Profissional e Treinamento.

Pedro Manuel Leal Germano – Médico Veterinário pela FMVZ/USP, Sanitarista, Mestre, Doutor e Professor Titular pela FSP/USP. Coordenador do Curso sobre Vigilância Sanitária de Alimentos. Atuação profissional na área de pós-graduação e extensão da FSP/USP.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

HIGIENE E VIGILÂNCIA SANITÁRIA DE ALIMENTOS


HIGIENE E VIGILÂNCIA SANITÁRIA DE ALIMENTOS
De autoria de Pedro Manuel Leal Germano e Maria Izabel Simões Germano, em sua 3a edição, ano 2008, pela Editora Manole (ISBN: 978-85-204-2623-4), constitui uma obra de referência para estudantes e profissionais, de empresas privadas e do setor público, interessados na inocuidade dos alimentos em toda cadeia de produção – do campo à mesa.

Aborda as patologias transmitidas por alimentos, assim como algumas das principais ferramentas para garantir a segurança alimentar: auditoria, consultoria e treinamento.

Esta nova edição, revisada e ampliada, com 1032 páginas, encadernado em capa dura, no formato de 16 x 23 cm, com peso de 1500.00 g, traz quatro capítulos inéditos e foi atualizada, inclusive no que concerne à legislação específica, visando abranger o que há de mais recente na área de alimentos.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

LISTERIA E LISTERIOSE

LISTERIA E LISTERIOSE: PERIGO PARA AS GESTANTES

Nas páginas deste livro, o qual preenche importante lacuna na área da microbiologia de alimentos, encontram-se os mais importantes conceitos sobre a Listeriose e suas implicações na gestação.
A obra é fruto da pesquisa desenvolvida pela nutricionista Gillian Alonso Arruda, junto à Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, para obtenção do título de Doutor.
Assinam o trabalho os professores Pedro M.L. Germano (orientador), Maria Helena Matté (responsável pelo Laboratório de Saúde Pública) e Carlos J.R. Oliveira (pesquisador da Unifesf e do Incor).
ISBN 978-85-88174-09-2
Número de páginas: 143
Edição: 2007
Editora Ponto Crítico




domingo, 1 de junho de 2008

ORGANISMOS AQUÁTICOS

SANIDADE DE ORGANISMOS AQUÁTICOS NO BRASIL
De acordo com José Roberto Borghetti, da Organização das Nações Unidas para Agicultura e Alimentação - FAO, este livro foi organizado com a visão focal de que a sanidade de organismos aquáticos tem importância científica, ecológica, econômica e social nos amplos programas de cultivo de organismos aquáticos brasileiros.
Progressivamente, a aqüicultura brasileira está crescendo de forma acelerada, e vem ganhando posições no ranking internacional, tanto em produção, quanto em receitas geradas, o que implica a necessidade de um crescente nível de profissionalismo para se atuar em todos os elos da sua cadeia produtiva.
A sanidade dos organismos aquáticos é fundamental nas condições de cultivo intensivo, no qual ocorre maior sensibilidade e menor resistência às enfermidades, as quais podem tornar-se uma grande ameaça ao crescimento sustentável da aqüicultura brasileira.
Neste livro, os autores buscam resgatar as informações mais recentes e atualizadas disponíveis, com uma contribuição qualificada sobre sanidade de organismos aquáticos no Brasil, de forma a se tornar uma fonta de consulta atual e futura.

Organizado por Ângela Teresa Silva-Souza
Editora: Abrapoa
Local: Maringá, Paraná, Brasil.
Ano: 2006
ISBN: 85-60161-00-7
Número de páginas: 387

quarta-feira, 28 de maio de 2008

LEITE E FRAUDES

PRESERVAR A QUALIDADE DO LEITE E COMBATER FRAUDES

No período de 12 a 13 de dezembro de 2007, foi realizado o “Seminário sobre o Centro Integrado de Monitoramento da Qualidade do Leite – CQUALI Leite, Procedimentos Operacionais”, sob os auspícios da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa e do Instituto Nacional de Controle da Qualidade em Saúde – INCQS, nas dependências do INCQS, no campus da Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ, Manguinhos, Rio de Janeiro.
O evento teve o grande mérito de ser esclarecedor no que diz respeito às atividades das diferentes instância públicas, sobretudo Ministério de Saúde e Ministério da Agricultura, Pecuária e Alimentos, integrando-se ao Ministério da Justiça, ao Ministério Público e à Polícia Federal, o que possibilitou a investigação das empresas responsáveis, pela fraude do leite, e a imediata toma de providências jurídicas pertinentes ao caso.
O tema apresentado pela advogada integrante da Procuradoria da Anvisa, também, permitiu o entendimento das dificuldades impostas pelo excesso de documentos legais, com centenas de artigos, parágrafos e itens, os quais no seu conjunto impedem a instrução do processo administrativo, de acordo com os métodos de ordem legal, o que conduz ao benefício, na maioria das vezes, do infrator.
A palestra do Dr Sebastião Brandão, da Universidade Federal de Viçosa, deu a real dimensão do problema das fraudes do leite no Brasil, motivadas pelo espírito de ganância de produtores. Ficou bem claro, que à medida que os laboratórios aumentam a capacidade de detecção de novas substâncias químicas, empregadas para fraudar o leite, alterando, drasticamente, sua composição nutricional, os produtores lançam mão de profissionais com suficiente conhecimento químico, para introduzir novas substâncias que possam ser acrescentadas ao produto e que não sejam detectadas pelas técnicas usuais.
As fraudes, de modo geral, têm o objetivo de aumentar o volume produzido entregue aos lacticínios – acréscimo de água e de soro de leite, reduzindo sua qualidade nutricional. Mas estas atitudes não param por aqui, a adição de reconstituintes, neutralizantes e conservantes é uma verdade, e o episódio da soda cáustica e da água oxigenada não pode ser negado.
Para a pasteurização ser bem sucedida é necessário que a carga bacteriana do leite entregue ao lacticínio esteja de acordo com os padrões sanitários do MAPA, caso contrário este procedimento não será eficaz. Por isso os fraudadores utilizam substâncias capazes de diminuir altos níveis de contaminação, que não possam ser detectadas pelos Laboratórios Centrais (LACENs).
A fraude pode ocorrer no leite in natura, no pasteurizado, no em pó, no UHT e outros. Ela leva à adulteração do produto por diminuição de suas propriedades nutritivas. Portanto a fraude é um crime, seja por prejudicar a saúde dos consumidores, seja por afetar a própria economia do país.
As discussões sobre padronização da fiscalização forneceram um panorama de complexidade, próximo ao caos administrativo, devido às dificuldades de comunicação entre as VISAs, seja no âmbito dos municípios, seja nos dos próprios estados.
Nesta aspecto é clara a necessidade urgente de aumentar a eficiência do fluxo de dados entre LACENs e VISAs, como tratar a comunicação de risco, como organizar o conjunto das ações e estabelecer quais os critérios para as interdições cautelares.

Pedro M. L. Germano, membro da Câmara Técnica de Alimentos CTA/GGA/Anvisa/MS